A lista de exposições de artes plásticas tem aumentado significativamente em São José dos Campos. Novas gerações produzindo pinturas, gravuras, desenhos, esculturas, muitas pesquisas contemporâneas prontas para saírem dos ateliês.
É o tipo do problema bom: muita arte procurando espaços expositivos e seu público. Tal qual uma represa que fica ali contida até uma pequena fissura causar um singelo escape de água que vai aumentando e finaliza inundando toda a paisagem do entorno.
Nesse caso não são Brumadinhos nem Marianas. Essa nova geração de artistas com certeza não quer represar e sim criar fissuras para extravasar sua produção artística e existir no mundo. Querem inundar a paisagem urbana com arte.
Por mais que o sistema não propicie e nem suporte esse processo tão necessário de se expor, podemos constatar que a força produtiva artística não se submete a essa inércia das instituições.
A grande maioria dos artistas tem encontrado locais sem estrutura para mostrar suas obras, ficando muitas vezes num sistema precário de enfeitar ou decorar espaços comerciais. Como já comentei algumas vezes, as mostras artísticas têm objetivos bastante definidos que vão além da apreciação ou de encontrar o quadro que combine com a cor do sofá.
São considerados equipamentos públicos culturais os museus, as bibliotecas, teatros, salas de música, anfiteatros, edificações públicas qualificadas e abertas para cada tipologia cultural. Cada uma delas com rubricas estipuladas no próprio budget institucional para execução satisfatória da sua “missão” e “valores”.
A constância de mostras leva ao que chamamos de formação de público. A presença de educativos relacionados com os processos criativos dos artistas propicia experiências estéticas das quais o público pode participar e ir além da mera apreciação.
São as visitas guiadas, as oficinas e as conversas com os próprios artistas que despertam novas possibilidades de percepção e ampliam interesses.
Fissurados
Um artista jovem que vem amadurecendo sua produção deseja expor seu trabalho, pois será nesse momento que estará se submetendo à apreciação e crítica do público. A exposição é uma necessidade no percurso do artista, assim como a leitura do livro é para o escritor, um show de música é para o músico.
Encontros promovidos por grupos independentes de instituições públicas fazem parte da dinâmica cultural e favorecem o desenvolvimento profissional dos artistas. Assim tem sido no Teatro Marcelo Denny, que desde o pós-pandemia já expôs obras de mais de 20 artistas joseenses numa proposta de incluir as artes plásticas para o público do teatro.
Esse percurso é turbulento e inevitavelmente permanente. São décadas que assisto a essa demanda por espaços expositivos para as artes plásticas em nossa cidade. Em 2014, realizamos a Exposição USINA 14 no CEFE (Centro de Formação do Educador) e tivemos mais de 4 mil visitantes e muitas ações educativas com os professores de arte municipais.
Voluntariamente desenhamos e produzimos todo equipamento expositivo e mais os materiais gráficos, o educativo como palestras, oficinas e apostilas. Realizamos mais uma mostra no CEFE, mas sem continuidade, perdemos um extraordinário espaço expositivo. Se em algum outro momento houve alguma tímida iniciativa, ela não foi suficiente para vingar e permanecer.
Uma prática comum entre os artistas é submeterem suas produções para serem avaliadas em outras cidades, estados e países, concorrendo em disputados editais. Ser selecionado por alguma instituição pública reconhecidamente importante vai agregando visibilidade e inclusive valor de mercado para o artista.
Isso porque os museus, instituições públicas e privadas têm critérios e profissionais para analisar e selecionar as obras que desejam expor em seus espaços. Dessa maneira, são locais que validam as obras e valorizam currículos. Assim tem sido, mesmo que não se concorde com o sistema.
Duchamp tentou quebrar esse “protocolo” — quem diz o que é uma obra de arte para estar num museu? Seu urinol assinado com o nome da fábrica que o construiu tornou-se ele mesmo obra de arte e inaugurou o ready made. Da crítica ao sistema à consagração artística: um percurso para poucos.
Mercado de arte joseense
Não temos mercado de arte, apesar do empreendedorismo ser essência do município e a palavra “business” estar até em conversas de padaria. Os artistas, desde sempre autônomos, recorrem a inúmeras outras atividades remuneradas para conseguirem manter suas produções de ateliê.
Arte como business e empreendedorismo está na união de artistas e produtores culturais mais a constância de exposições — função das instituições.
Queremos formar público e atrair colecionadores que desconhecem a produção local.
Fissuras se ampliando e algumas exposições que já ocorreram este ano movimentaram milhares de visitantes.
Agenda: o que vem por aí
Algumas novas vernissages se somarão à recente “Tramas da Terra”, inaugurada dia 31 de maio no De Étser Ateliê, localizado no km 9,5 da estrada do Luso. Com curadoria de Célia Barros, a artista Bel Matos — que possui vasta pesquisa com pigmentos naturais, assim como fibras, terra e minerais — apresenta trabalhos inéditos com formatos e dimensões variadas.
No Instagram @expo.tramasadaterra +@belmatttos podemos acessar dias e horários de visitas, oficinas e o encontro com a artista desta belíssima exposição que dialoga diretamente com a terra ali da Vargem Grande.
Voltando ao circuito urbano, que tenta se firmar, com curadoria de Francela Carrera, a exposição “Geometria do Tempo” da artista Fabiolla Canedo busca nos apresentar o tempo visível, uma tipografia silenciosa do passado, presente e futuro.
Sua pesquisa poética investiga o tempo não como medida, mas como presença, transformação e memória. No seu Instagram @fabiollacanedo podemos acompanhar todas as ações que a artista desenvolverá a partir da abertura no dia 07 de junho.
“Cores sem Gênero” é a próxima exposição da artista Fernanda Segolin dentro do seu “Dog’s Project”, onde uma personagem canina inspirada na linguagem de cartoon explora temas como liberdade e autenticidade.
Com curadoria de Francela Carrera, a mostra abrirá dia 11 de julho e também trará inúmeras interações com o público. O Instagram da artista com mais informações é o @vireialmofada
“Emílio Goeldi e as Aves Amazônicas” ocupará o pavilhão São José no Parque Vicentina Aranha até 6 de julho, apresentando 50 obras suspensas, impressas em tecido, celebrando a riqueza da biodiversidade brasileira. Siga a agenda do @parquevicentinaaranha para saber mais.
A Galeria Belo Brasil, única galeria de arte presente na cidade, localizada no Shopping Colinas, tem curadoria da artista Cristina Demétrio. Mantém constantes exposições e realiza eventos para promover os artistas e a venda de suas obras, árdua tarefa de formação de público e atração de colecionadores. Horários aqui no @galeriabelobrasil
O Museu Municipal apresenta, no andar de baixo, a exposição “Das Paredes ao Museu”, mostra coletiva com diversidade de linguagens incluindo o @clubedagravura. A visita acontece das 9h às 18h, de terça a sexta-feira, e sábado das 9h às 13h.
E no Teatro Marcelo Denny, a exposição Mergulho, com colagens da artista Andressa Carvalho, ficará até 10 de julho. Na sequência, teremos mini esculturas da artista Natalia Aia — degustação no @anataliaaia. Dias e horários no @teatromarcelodenny.
A agenda de agosto está no forno. Parece que as singelas fissuras estão ficando cada vez maiores e o fluxo de mostras não será mais represado no que depender dos artistas.
Na Suíça, atualmente, os médicos têm indicado visita aos museus e mostras de artes para pacientes depressivos e com quadros de angústia, que aumentaram muito no país. Entre quadros de angústia e quadros de pinturas, fiquemos com os últimos: sigamos fissurados por arte.
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