Bakhmut [Báhmut], no leste da Ucrânia, é hoje um montão de escombros e crateras. Filmagens de drones nos mostram as fileiras de prédios queimados e semi-desmoronados, um após outro. Não se vê um só edifício intocado nesta cidade que, antes de 2022, contava mais de 70 mil habitantes.
De certa forma, Bakhmut não é mais cidade: é campo de batalha. É um ponto focal da guerra onde milhares perderam as vidas em um ataque que durou um ano — de maio de 2022 até maio deste ano, quando as últimas tropas ucranianas se retiraram.
Agora, são os ucranianos que tomaram a iniciativa e vêm aos poucos avançando e cercando a cidade novamente.
Mas o que há de tão importante ali? O que justifica o sacrifício de tanta gente em um lugar só, numa cidade que não é nem de longe uma das mais importantes da região?
A resposta não é clara, mesmo para os “generais de poltrona” que debatem cada nova jogada da guerra. Antes de mais nada, não é absurdo dizer que parte desta batalha possa ser, dos dois lados, um caso da famosa “falácia dos custos irrecuperáveis”, onde os recursos gastos com uma coisa nos levam a acreditar que ela tem um valor maior do que realmente tem. Mas, dito isso, existem bons motivos para a tenacidade ucraniana na defesa da cidade.
Podemos considerar quatro elementos principais.
A conveniência militar
Bakhmut já havia sido quase capturada antes, em 2014. Na época, os habitantes desta e de outras cidades, organizados como milícias, liberaram a cidade após poucos meses de combate.
Desde então, a cidade passou a contar com maiores fortificações. Mas foi também graças a Soledar, a cidade vizinha, que Bakhmut ganhou importância como ponto forte ucraniano. Soledar é uma cidade mineira e tem algumas das maiores minas de sal do mundo — uma verdadeira rede subterrânea que fez dela um lugar perfeito para a resistência ucraniana após o começo da Batalha do Donbas, após o avanço russo no norte da Ucrânia, na direção de Kyiv, ter sido derrotado.
Quando Soledar caiu, após meses de batalhas duríssimas, Bakhmut era o próximo ponto para os ucranianos deterem a tentativa de avanço russa. Era um ponto conveniente para a resistência.
A defesa de outras cidades
Bakhmut é a maior cidade antes de duas grandes cidades no distrito de Donetsk que os russos procuravam capturar: Kramatorsk e Sloviansk, as quais, combinadas, chegam a quase 300 mil habitantes.
Se Bakhmut tivesse caído em pouco tempo após a Rússia ter voltado o foco para a região do Donbas, é provável que os russos teriam conseguido chegar a estas cidades, as quais por sua vez teriam virado alvo da artilharia russa.
Isso, aliás, nos faz lembrar que, nessa guerra, a maior destruição vem da artilharia. É a mesma tática pela qual os russos destruíram Alepo, na Síria, e Grozny, na Chechênia; também assim foi arrasada Mariupol, cidade portuária ucraniana com quase meio milhão de habitantes, no começo da invasão de 2022.
As cidades longe do front — como a capital, Kyiv —, sofreram com ataques de drones e mísseis, mas estão longe de terem sido destruídas.
O atrito
Após Bakhmut cair totalmente nas mãos dos russos, no final de maio deste ano, o avanço russo acabou. Por quê? Porque a iniciativa russa, para usar o termo militar, atingiu o “ponto de culminação” — o ponto onde se consome o avanço de um exército.
Muitas das melhores divisões russas, incluindo as famosas VDV, ou forças aerotransportadas, foram desgastadas ou até mesmo deixaram de existir nos meses e meses tentando tomar Bakhmut. Aliás, nos últimos meses da batalha, o avanço russo vinha quase todo do grupo Wagner, que recrutou milhares de soldados nas prisões da Rússia com a promessa de liberdade para quem sobrevivesse mais de seis meses. (Poucos obtiveram a prometida liberdade.)
Esse atrito é típico. Trata-se de uma guerra de exaustão: uma guerra de artilharia, de trincheiras, de poucos avanços e onde o defensor conta com a vantagem. Ao fincar o pé em Bakhmut, os ucranianos mantiveram por um bom tempo uma taxa de atrito favorável (em certo ponto, 7 russos para cada 1 ucraniano) e exauriram a capacidade russa de conquistar Donetsk. Calcula-se que as baixas russas em Bakhmut estejam nas dezenas de milhares de soldados.
O simbolismo
Em dezembro, Zelensky fez uma visita surpresa a Bakhmut. Foi uma jogada arriscadíssima.
Zelensky estava se colocando no ponto mais quente da guerra, a poucos quilômetros ou menos do inimigo, em um momento onde muitos já prediziam que a cidade cairia em questão de dias ou semanas. Mas a visita serviu como um gesto de desafio aos russos, uma prova de confiança nas Forças Armadas ucranianas e um reforço ao moral ucraniano naquele momento difícil, quando o país todo sofria com os ataques à infraestrutura e os apagões constantes no meio do inverno.
No final de julho, há uma semana, Zelensky visitou novamente a região. Dessa vez, são os ucranianos que estão no ataque, recuperando a cada semana mais território nas vilas ao norte e sul de Bakhmut. Talvez em pouco tempo a cidade seja liberada.
A visita de Zelensky mostra a importância que a cidade sacrificada adquiriu nas mentes dos ucranianos. Apesar de destruída, agora todos os ucranianos a conhecem — junto com milhões de pessoas no mundo todo.
No futuro, a Batalha de Bakhmut será vista como um momento fundamental da história da Ucrânia. Após deixar de existir fisicamente, a cidade ganhou uma segunda existência imaterial, mas talvez mais duradoura: símbolo do sacrifício, da resistência e do heroísmo ucraniano.
Talvez o melhor jeito de falar sobre Bakhmut seja emprestando palavras de Hemingway: Uma cidade ucraniana pode ser destruída, mas não derrotada.
Leia mais: Kiev ou Kyiv?
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