Clara, Davi e Daniel não ficam distantes dos olhares do pai. Cada um no auge da própria infância, eles crescem juntos nos fundos da casa amarela e de portão cinza na rua Lupicínio Rodrigues, no Jardim Ester, enquanto Junior emenda uma fornada atrás da outra. Quando não na bagunça, os três filhos brincam de assar pães artesanais, feitos num lar que não se dá o trabalho de parecer padaria.
A mesa onde o trabalho se debruça é de madeira, muito bem cuidada, e tem bancos compridos para caber a família e mais um ou outro convidado. O forno já foi à lenha e improvisado, hoje não é dos melhores, mas é o que tem. A masseira industrial, peça das mais valiosas do quintal, aguenta 15 quilos.
Os pães, em dias sem muito calor, ficam no tempo descansando sobre um tabuleiro de metal antes de ir para o forno. As massas costumam ser postas de três em três e separadas pelas dobras de um pano de prato, que forra a cama. Mais caseiro que isso só o padeiro.
O quintal padaria (Créditos: Gabriel Duarte/portal spriomais)
Vanderley Tadeu dos Santos Junior passou boa parte dos seus 35 anos trabalhando para o comércio dos pais, que até hoje tocam um mercadinho na zona sul de São José dos Campos. Quando a crise veio forte há alguns anos, ele foi se arriscar na indústria.
Ganhava pouco e trabalhava com o que mandavam fazer em uma terceirizada dentro da Petrobrás. Escalou posições e durante um ano passou por três empresas que prestam serviços na refinaria. Ficava longe dos filhos, da esposa Mariana e do que há algum tempo descobriu que lhe garantia prazer: fazer pão.
Entrar na panificação, há cerca de um ano, foi um risco mais saboroso. Ele já havia feito alguns cursos depois que passou por uma saga de meses tentando acertar uma receita de pão italiano por puro desafio pessoal. Os testes, sem pretensão profissional alguma, acabavam na mesa de casa, dos vizinhos e dos amigos.
Depois das primeiras levas com todos os tipos de imperfeições, do pão que não cresceu ao azedo, Junior acertou a mão e todos passaram a concordar que ele assava pouca massa para uma cidade tão grande. A própria fé nesse talento, como tem em São Francisco ou Nossa Senhora, demorou a vir. “Faltava eu acreditar que eu sabia fazer pão e podia viver do negócio”.
Depois de começar a vender os pães, ganhou nome composto e virou “Junior Baker”, uma gourmetização do apelido que pegou entre colegas de trabalho e parentes. Era muito para ele. Ou melhor, não era ele. Uma revisão na própria identidade fez surgir o Padeiro da Casa.
“Quando eu me descobri baker, eu achava que fazer pão era uma coisa muito chique. Mas quando eu percebi que minha casa tava uma bagunça, que era farinha pra todo canto e que eu trabalhava das 5h da manhã até a meia noite, eu percebi que eu não era baker coisa nenhuma. Eu sou padeiro”, colocou o ponto final.
Junior usa boinas para disfarçar a maturidade que entra no cabelo. O adereço também é proposital, puro marketing. “Eu fiz administração, gosto muito disso, criar uma característica para mim”, explica.
“Antes eu usava para frente, mas agora coloco para trás, acho que fica um pouco mais descontraído, sabe?”, ele ri. O look completo inclui óculos de grau preto, um avental sempre sujo de farinha, como nos filmes, e um par de havaianas.
Junior, seu pão e sua surrada boina mostarda (Créditos: Gabriel Duarte/portal spriomais)
Bem em cima da bancada onde a massa é sovada está um quadro branco que conta a história de cada semana. Os pedidos, quantidades, sabores, ingredientes, dias, fica tudo lá anotado.
As receitas costumam levar 50 minutos para assar. O forno é a parte final de uma produção que precisa de organização, já que se estende por dias pela ação sem qualquer pressa do levain, fermento natural à base apenas de farinha e água, tão simples, mas repleto de sentido dentro do movimento slow food, que valoriza ingredientes, o apreço pelos sabores e a nossa saúde.
Grudados no quadro também vivem dois cronômetros que ajudam o padeiro a não se perder no tempo dos pães. Desde que começou a trabalhar de casa, porém, não precisa reservar horário na agenda para ver os filhos crescerem e acompanha cada instante da fermentação deles lentamente.
Daniel, com 6, e Davi, de 7 anos, comem e dão seus pitacos. O padeiro diz que as reações do caçula são as mais sinceras. “Quando ele não gosta eu filmo porque é muito engraçado”, conta ao lembrar de uma receita de cookies que Daniel pôs na boca, mas sequer se prestou a engolir. O pequeno, que tem síndrome de down, é dono de um paladar sem rodeios. “Se ele gostou, bem, se não gostou…”.
Clara, aos 12, a mais crítica, também participa da produção três vezes na semana e ganha para isso. “Não é uma pegada tão pesada. Ela é remunerada dentro do que as pessoas pagam para um ajudante de padeiro porque eu acho justo”, diz.
No último dia dos pais, a mais velha lhe cobrou em uma cartinha que a ensinasse uma receita o quanto antes. À mão, escreveu que queria aprender a fazer pães para retribuir tudo o que recebeu do pai quando estivesse “bem velhinho”. Junior caiu no choro.
“Eu tô marcando eles de forma positiva. Por mais que seja muito desafiador, eles veem minha luta, da minha esposa, para pagar as contas e dar o melhor para eles, mas com um pouco de leveza, de alegria, de bagunça”, pondera.
O dono da padaria é quem faz toda a divulgação e o Instagram é sua vitrine. No @padeiro.dacasa, você consegue ver o cardápio, encomendar seu pãozinho, acompanhar o dia a dia da família e até descolar uma receita ou outra para tentar colocar a mão na massa também.
Não tem burocracia, muito menos formalidade. Junior te pega pela barriga, mas te ganha com a gentileza. O padeiro faz delivery, mas para todos os clientes que tiram um tempinho para ir buscar os pedidos quentinhos na porta de sua casa, ele oferece um copinho de café.
Ainda faz questão de passar o café na hora da entrega e servir sempre um grão vindo de um pequeno produtor. Assim alimenta a cadeia que faz parte.
Ele diz que o cardápio é enxuto e assim deve continuar, porém está sempre aberto às sugestões da clientela, hoje composta por cafeterias, restaurantes e obviamente quem só quer um bom pão para passar manteiga. Só não sova o que não acredita e o que ele próprio não consumiria.
A febre recente do pistache? “Nunca me rendi para vender mais”, enfatizou. Junior se sente desconfortável em levar ao menu combinações que não passariam pela mesa de casa.
A base do que produz gira em torno de pães rústicos, como baguetes, ciabattas, tranças e outros recheados, e os adocicados, por exemplo o brioche e os cinnamon rolls.
O que foge um pouco dessa regra é a massa de pizza, vendida pré-assada e que não precisa de nenhum forno especial para finalização, e o cookie de chocolate 40%.
A trança caseira e o tradicional pão italiano de 600g (Créditos: Gabriel Duarte/portal spriomais)
Seu pão favorito é o italiano. A versatilidade de fins para um único pão é o que seduz o padeiro. “Você faz uma bruschetta, pode virar um belo pão com ovo…”, ele dá as opções. Mas as queridinhas do público são as focaccias, mais achatadas, macias por dentro e crocantes por fora. A tradicional tem apenas alecrim e sal grosso, mas também há outras versões de recheio.
Por isso elas também são a indicação de Junior aos clientes de primeira viagem. “Se começa por ali, normalmente é um caminho sem volta”, diz.
“Para quem nunca comeu um pão rústico ou de fermentação natural, eu daria uma focaccia. Quem que não gosta de um bacon, um tomatinho, um queijo, cebola caramelizada? Como focaccia vai tudo isso e mais um pouco, dependendo do sabor, a pessoa vai experimentar pela primeira vez um pão com sabores que ela está acostumada”.
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