Muitos devem se lembrar que em setembro de 2023, a varejista Americanas surpreendeu o Brasil ao anunciar um rombo contábil de R$ 20 bilhões em seu balanço. Em poucas horas, as ações despencaram mais de 75% na Bolsa, apagando cerca de R$ 8,4 bilhões em valor de mercado em um único dia.
Independentemente das disputas jurídicas, o episódio escancarou um ponto, a fragilidade de governança não é detalhe técnico, é questão de sobrevivência. Quando a governança falha e seja por falha de supervisão do conselho, por lacunas em controles internos ou pela ausência de transparência, toda a agenda ESG desmorona.
Se a governança é o “G” do ESG, ela é também o pilar invisível que sustenta os outros dois. Sem ela, compromissos ambientais e sociais não passam de slogans frágeis.
A tendência global é clara: conselhos e diretores estão sob pressão crescente para fortalecer governança.
– Um relatório da Russell Reynolds (2025) aponta que investidores institucionais vêm exigindo mais diversidade e preparo dos conselhos, e que a sucessão de lideranças se tornou um tema central de governança.
– De acordo com a PwC, 21% dos conselheiros admitem que seus conselhos não têm expertise suficiente para lidar com as novas demandas ESG, especialmente em coerência de narrativa e riscos emergentes (Axios).
– A Reuters (2025) mostrou que, nos EUA, propostas de acionistas sobre reformas de governança receberam em média 33,9% de apoio, enquanto pautas ambientais e sociais receberam apenas 15,7%.
Novos desafios: IA, ciber e geopolítica
A governança não se limita a números no balanço. Os conselhos hoje enfrentam riscos novos e complexos:
– Inteligência Artificial: supervisionar vieses, transparência e explicabilidade em modelos que já impactam crédito, seleção de pessoas e até decisões judiciais.
– Cibersegurança: falhas de dados já custam em média US$ 4,45 milhões por incidente globalmente, segundo o relatório de custo de vazamentos da IBM (2023).
– Geopolítica e cadeias de suprimento: empresas precisam prever e reagir a sanções, guerras e rupturas de logística.
O que boas práticas ensinam
– Comitês especializados de conselho para ESG, inovação e ética.
– Relatórios assegurados externamente por auditorias independentes, usando frameworks reconhecidos como GRI, SASB e TCFD.
– Treinamento contínuo de conselheiros para lidar com riscos climáticos, IA e geopolítica.
– Coerência narrativa: alinhar discurso em relatórios, redes sociais e fala de executivos para evitar contradições fatais.
Se o caso Americanas serviu de alerta para o Brasil, a lição é simples: governança falha custa bilhões, destrói reputações e derruba pilares ambientais e sociais junto com ela.
No mundo, investidores já perceberam que fortalecer o “G” é proteger o “E” e o “S”. No Brasil, precisamos transformar governança de obrigação regulatória em valor estratégico.
Governança sólida não é apenas compliance, é o que separa empresas que inspiram confiança daquelas que colapsam no primeiro vento contrário.
No fim, ESG na prática começa com um “G” bem estruturado. Sem governança, todo o resto é discurso vazio e uma grande ameça para a sustentabilidade empresarial.
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