Os números são espetaculares para o cinema nacional… 5 milhões de espectadores apenas no Brasil e R$ 104,7 milhões arrecadados desde seu lançamento oficial no Festival de Veneza, em 2024, além de uma sucessão de prêmios (39 até aqui e contando), entre eles o Goya, principal prêmio do cinema espanhol, o Globo de Ouro de Melhor Atriz para Fernanda Torres e o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, fora as indicações de Oscar para Melhor Filme e Melhor Atriz.
Exibido em mais de 17 países, em uma lista que cresce cada vez mais, “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, baseado no livro de Marcelo Rubens Paiva, é sinônimo de sucesso no Brasil e fora dele.
É cinema em estado da arte: boa história, bons atores, direção firme e, ao mesmo tempo, sensível. Tudo isso para contar a história de um crime ainda sem castigo.
Mais de 50 anos após a prisão, tortura e morte de Rubens Paiva em 1971, as pessoas envolvidas nessa operação, todos militares, não foram condenadas, embora tenham sido todos, todos eles, identificados.

Ao contrário. Alguns acabaram condecorados e promovidos ao longo da carreira. Três já estão mortos. O corpo de Rubens Paiva, esse nunca foi encontrado. Mesmo o atestado de óbito só saiu em 1996, após intensa batalha na Justiça.
Na esteira do sucesso de Ainda Estou Aqui, essa história tem sido contada e recontada, em um exercício didático que talvez seja a maior conquista do filme: contar a história recente do Brasil a milhões e milhões de brasileiros.
Outras leituras para você que gostou do filme:
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O Brasil tratou mal as feridas deixadas pela Ditadura Militar. Acobertada pela Lei da Anistia, a violência da Ditadura não foi investigada, julgada e condenada, ao contrário do que ocorreu em países vizinhos, como a Argentina.
Houve tentativas e ações nesse sentido, como o movimento “Ditadura Nunca Mais” e os trabalhos da Comissão da Verdade. Mas, e os culpados? A esses restou casos isolados de condenação, menções em livros de diversos história política e a sombra pesada lançada por eles sobre seu passado.
O Brasil não acertou as contas com seu passado e, como efeito, esse passado, vira e mexe, volta a nos assustar.
Agora, com a denúncia feita pela PGR (Procuradoria Geral da República) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e mais 33 pessoas por tentativa de golpe de Estado em 2022, o país tem uma nova chance de mudar essa história.
O ex-presidente tem até esta quinta-feira (6) para apresentar sua defesa ao STF (Supremo Tribunal Federal). Ele sonha com a anistia a ele e a todos os envolvidos nesse enredo de golpistas, aos quais se somam os condenados pelos atos terroristas de 8 de janeiro de 2023.
Jair Bolsonaro tem amplo direito de defesa e seu julgamento deve ser exemplar. Inocentado, ganha a liberdade. Condenado, que cumpra o que manda a lei.

Sem golpe, sem artimanhas e sem anistia. Sob pena de que, daqui a alguns anos, tenhamos que saudar um novo filme que venha a contar a história brutal do país e a nos lembrar dos crimes e arbitrariedades cometidas em nome do Estado.
Se nós, democratas, resistentes, ainda estamos aqui, é preciso reconhecer que eles, os que sonham com a volta da ditadura, do arbítrio e do regime de exceção, também estão.