
A obra integra a exposição do fotógrafo em cartaz no CAEB até 25 de novembro de 2025. Horários de visita: consulte @caebsjc (Créditos: Caeb)
Temos um grande tesouro danificado, afastado da vida cotidiana. Tornado em fragmentos desconexos sobre nossa origem com histórias adormecidas que necessitam de cérebros criativos para ativar novas relações com seus importantes e necessários conteúdos. Nossa história, costumes, memorias, rituais, vagam como fantasmas por arquiteturas em ruínas. Temos um acúmulo de passado pressionando nosso presente.
Simbolicamente o bolinho caipira não dá conta desse arco histórico, nem da inovação que necessitamos. Tornou-se clichê tanto quanto títulos enigmáticos que arrebanhamos constantemente em institutos de pesquisas.
Já fomos a terra dos tuberculosos, crescemos como vila e hoje usufruímos de sua arquitetura hospitalar culturalmente. Fomos a melhor localização estratégica do país e por isso crescemos tecnológica e industrialmente, temos muitas arquiteturas abandonadas deste período que não podemos usar. Já fomos o maior centro de pesquisa do clima da América Latina e ainda não temos valores ecológicos inseridos na política municipal.
Segundo o Google, temos hoje mais de 16 shopping centers e malls comerciais em São José dos Campos, mantendo nosso histórico protagonismo comercial da região juntamente com os inúmeros atacadões que fervem de segunda a segunda.
Também podemos notar o aumento de números de farmácias por quarteirão, uma disputa medicamentosa. O único Mac Donald’s que faliu no mundo foi aqui no centro da cidade em frente ao correio, um enigma. Hoje são dez pela cidade. Sabemos atrair consumidores.
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Evidentemente nos tornamos uma cidade que valoriza o consumo, que tem um sistema simbólico com régua própria que classifica coisas e pessoas na vida social, estrutura valores, constrói identidades, regula o poder e incentiva padronizações. E está tudo bem sermos o retrato do mundo contemporâneo consumista, mas nossa história nos assombra, pois sabe que podemos mais como protagonistas que já fomos.
Nesse sistema de consumo, a arte e cultura não são bem-vindos, pois atuam justamente para a diversidade, pluralidade, expansão criativa e crítica.
Em busca de novos sentidos
Século 21, 2025, o futuro chegou, desafiador, exigente, enigmático, amedrontador. O que queremos é ser uma cópia das capitais com inúmeros certificados tentando provar que somos melhores?
É preciso debloquear os processos de simbolização do consumo e produzir novos sentidos ao que temos vivenciado. Necessitamos elevar nosso patamar cognitivo. Precisamos da estranheza para deslocar nossas percepções repetitivas e clichês. O tempo das colunas gregas douradas enfeitando arquiteturas modernas virou piada, é cafona.
A oportunidade econômica e de novos conhecimentos é imensa para virar esse jogo. Os programas de incentivo e financiamento culturais estão atingindo todas as áreas, a hora é agora. A arte é uma intrincada cadeia criativa acessível que nos possibilita reconhecer o que percebemos e não conseguimos verbalizar.
Tesouros culturais e artísticos intocáveis aguçam os artistas conscientes da necessidade de uma revisão institucional que nos leve a um novo grau administrativo cultural, coletivo, diverso que contemple emergências exuberantes e senhas renovadas, um novo patamar criativo contemporâneo municipal.
Nosso modelo de política cultural está esgotado e tornou-se um trauma cheio de sintomas. É um eterno suspiro do que poderia ser e nunca foi.
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Vivemos culturalmente um território restrito de um modelo tolerado e fechado que reforça o consumo de forma acrítica e alienada. Uma aparente timidez planejada que oculta a disputa simbólica, aquela que define os valores que devemos considerar. Disputa que usa fatos ou imaginários para lacrar nas redes.
A arte melhora a cidade. É o campo da experimentação de possibilidades para pesquisa histórica, desenvolvimento tecnológico, reconhecimento das tradições, integração de todos os processos, novas conexões e principalmente nos sensibiliza.
Aprendemos com nossas tradições, valores, aumentando nossa capacidade de reconhecer a diversidade existente no coletivo. Esse é um dos erros recorrentes em nossa forma de pensar: não aceitar a pluralidade de valores e estilos de vida e querer reduzi-los a um único padrão.
A arte que temos está publicamente tímida, oculta, muito longe da que sabemos existir, necessária, livre, conectada, acessível, expandida, educativa, diversa.
A responsabilidade dos artistas joseenses para apresentarem suas obras tem necessidades peculiares e se agarram a cubos “brancos” vintages, ocos de estruturas e ainda assim disputados. Sem medo de exagerar, a dinâmica é a mesma para o teatro, música, literatura, dança.
A produção está muito potente e estocada, um desafio na arquitetura cultural com equipamentos insuficientes e falta de especialistas. O sistema cultural se profissionalizou assim como os coletivos e espaços independentes.
Essa transformação não precisa acontecer com a espécie humana toda, mas sim nas cabeças criativas que têm o papel de interpretar e de dar o caminho e o sentido para que o todo se renove além da previsibilidade clichê, tímida, insuficiente.
Precisamos iniciar esta transformação sob pena de virarmos irrelevantes no campo da originalidade, permanecermos cópias de cópias. Nossa história foi feita de ousadias e criatividade e agora estamos travados, amedrontados com a nossa arte e cultura, tememos nossa própria história.
Você quer lembrar ou esquecer? Que a cultura descanse em paz.
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