Domingo, quase no horário da última sessão programada de “O Papel de Parede Amarelo e Eu”, Gabriela Duarte chega ao saguão do teatro, sorriso largo, energia de uma adolescente, aos 51 anos, nos bastidores do Teatro Colinas, um gesto simbólico, recebe pessoalmente o primeiro exemplar do jornal Acontece SPRIOMAIS, que dá ênfase ao espetáculo vistitante. Gabriela, sorri novamente e diz: “É bonito ver o espetáculo no impresso. O papel tem alma”.
A seguir, a conversa se desenrolou de maneira natural (um diálogo íntimo) entre artista e jornalista, dois olhares que se encontram no instante em que a arte e a vida se confundem.
Fabrício Correia: Gabriela, “O Papel de Parede Amarelo e Eu” marca um recomeço. O que te fez aceitar o desafio de estar sozinha no palco depois de tanto tempo de TV?
Gabriela Duarte: A necessidade de me reinventar. O teatro me devolve a presença, o instante. Eu queria estar inteira; não interpretando, mas sendo. Esse solo nasceu do mesmo impulso que me levou a escrever minha autobiografia: o desejo de dizer “agora eu escolho o meu caminho”.
Fabrício Correia: O texto original fala sobre aprisionamento e libertação feminina. O que desse universo dialoga com a sua própria trajetória?
Gabriela Duarte: Tudo. Essa personagem arranca as paredes que a cercam, e eu também precisei fazer isso na vida. Durante anos vivi sob expectativas; da mídia, do público, de mim mesma. Quando a gente se liberta, o corpo muda. A fala muda. É um renascimento.
Fabrício Correia: Alessandra Maestrini e Denise Stoklos dividem a direção. Como foi esse encontro entre três mulheres fortes e tão diferentes?
Gabriela Duarte: Um encontro de liberdade. Alessandra me deu precisão e delicadeza, Denise me deu coragem e carne. Entre as duas encontrei o equilíbrio entre o gesto e o pensamento. Elas foram bússolas; me ajudaram a olhar para dentro sem medo.
Fabrício Correia: Você disse que é maravilhoso “não se levar tão a sério”. Esse humor é uma defesa ou uma conquista?
Gabriela Duarte: Uma conquista. O humor é sabedoria. É o ponto em que a gente entende que o drama não precisa virar sentença. Rir de mim mesma me salvou. Aprendi a deixar o peso para trás. O riso também é resistência.
Fabrício Correia: O espetáculo nasceu junto da construção da sua autobiografia. Um alimenta o outro?
Gabriela Duarte: Completamente. Escrever foi mergulhar nas memórias. O palco é o corpo reagindo a elas. No livro eu me escuto, na peça eu me vejo. É o mesmo movimento de voltar à origem e tirar o verniz das palavras.
Fabrício Correia: Há uma frase sua que ficou marcada: “Não estou mais interessada em outra coisa que não seja a verdade.” O que é a verdade para você hoje?
Gabriela Duarte: É o que resta quando o filtro cai. A verdade é o que te deixa vulnerável, mas inteiro. Eu quero isso. Cansei das versões, dos papéis de parede que disfarçam a alma. Prefiro a nudez da sinceridade; mesmo que doa.
Fabrício Correia: Depois dos aplausos, quando o teatro se esvazia, o que fica em você?
Gabriela Duarte: Fica o silêncio; aquele bom, de missão cumprida. Fica a sensação de que a arte ainda tem poder de cura. E fica essa mulher que finalmente pode rir de si, com leveza e sem medo.
Nos bastidores, ao fim da entrevista, Gabriela folheia novamente o exemplar do Acontece SPRIOMAIS. “É bonito quando o papel fala de um papel”, brinca, segurando o jornal e lembrando o título da peça. A cena é simples, mas simbólica: o teatro acolhe a palavra impressa e a palavra devolve à atriz a sua própria imagem: viva, livre e autêntica.