
No último 27 de setembro, fui ao Colinas Shopping com uma missão muito séria: prestigiar o 7º Concurso de Receitas da Torteria Haguanaboka. No palco, uma mesa repleta das tortas finalistas chamava a atenção de todos — quem disse que era fácil resistir a tantas camadas de recheio, massa dourada e cobertura brilhando sob a luz do shopping? A vontade era de subir correndo no palco e pedir “um pedacinho de cada, só para não ser injusto”.
As mesas já estavam preparadas para receber os jurados, responsáveis por escolher a campeã e, claro, a próxima estrela das vitrines da marca, que há décadas já faz parte da vida de quem vive em São José dos Campos.
O concurso não era o único motivo da festa. Era também dia de soprar velinhas: a Torteria completava 35 anos. Em uma mesa à parte, um bolo bonito aguardava o momento do parabéns, enquanto entre os convidados estava a fundadora, Valéria Verdi, recebendo todo mundo com o mesmo sorriso que, suspeito eu, já deve ter convencido muita gente a levar uma fatia extra para casa.
Ao observar a movimentação entre finalistas, torcidas, convidados e curiosos, minhas memórias começaram a ganhar vida. Lembrei da primeira lojinha, ainda em uma edícula na Avenida Adhemar de Barros, no centro da cidade. Uma jovem professora concursada, apaixonada por tortas, decidiu trocar a estabilidade da carreira pela instabilidade deliciosa e desafiadora de abrir uma torteria.
Com apoio da mãe, Dona Miltis Verdi, uma batedeira emprestada e a própria mão de obra para pintar as paredes, deu início à sua jornada na área gastronômica. E, convenhamos, ainda bem! A inspiração? Das tortas que já fazia em casa e agradavam aos familiares, amigos e parentes, que logo queriam fazer suas encomendas.
Passei inúmeras vezes por lá: algumas para um almoço rápido com as tortas salgadas, outras para uma sobremesa, ou ainda para um café acompanhado dos bolos caseiros. Afinal, além de produtos de qualidade, fazia parte do meu caminho entre os hospitais Policlin, Santa Casa e Unicor.
Nessa época, a realização de uma tomografia, por exemplo, exigia paciência — chamávamos o técnico à distância, que precisava ligar e aguardar o aquecimento do aparelho para só depois fazer o exame. Cerca de hora e meia. Nada mais justo que aguardar esse tempo apreciando a boa mesa e a receptividade que encontrava na Torteria. O segredo estava na simplicidade: ingredientes selecionados, preparo artesanal e acolhimento caloroso. A receita perfeita para o sucesso.
Poucos anos depois — cerca de dois anos — a Torteria mudou-se para a Avenida Nove de Julho, endereço que mantém até hoje. O ambiente mais amplo e charmoso foi acompanhado de um cardápio diversificado: torta de frango com catupiry, de bacalhau, de alho-poró, além de bolos, cafés, saladas e opções voltadas a dietas especiais, como sem glúten e sem lactose, sem falar no Festival do Morango.
Esse último é um capítulo à parte — e confesso que perdi a conta de quantas vezes inventei caminhos alternativos só para justificar a “coincidência” de cair bem em frente à loja. E ainda o faço.
Com o tempo, as conquistas aumentaram. A loja do Colinas Shopping passou a fazer parte da minha rotina — paradas rápidas para comprar torta no almoço, encomendar bolos de aniversário para os filhos, ou simplesmente prolongar os passeios em família. Em 2015, a marca iniciou uma nova etapa: a expansão por franquias.
Atualmente, integra o Grupo Haguanaboka, que reúne a marca original e a La Torta by Haguanaboka, especializada em opções veganas ou sem lactose. Um marco importante, afinal, a Haguanaboka foi a primeira franquia de tortas caseiras (doces e salgadas) do Brasil.
A trajetória de Valéria Verdi é exemplo de coragem. Ela deixou a estabilidade de uma carreira pública para transformar paixão em negócio e sonho em grupo empresarial. Empreendedora, administradora e mulher à frente de um legado, conquistou não apenas o paladar, mas também o coração dos joseenses.
O evento continuava, muito bem organizado. Infelizmente, cheguei um pouco atrasado e não pude acompanhar as aulas-shows que antecederam ao julgamento final — uma sobre patês e outra sobre a montagem de tábuas de frios. Uma mesa com o resultado dessas aulas serviu ao público que lá estava, trazendo ainda mais o clima de festa. Pude disfarçar o atraso degustando como se estivesse “estudando o material didático”.
Na sequência, o mestre de cerimônia começou a chamar os jurados para a difícil missão que se seguia — escolher a torta campeã, que passaria a fazer parte das receitas da casa, além do anúncio dos prêmios para os dois primeiros classificados.
A comissão julgadora contava com nomes importantes, como o chef Paco Ortolá — La Paella de Paco (as paellas do meu ex-vizinho são sensacionais), o chef Euclides Vaz — do restaurante português Cassiano, que há anos desponta como um dos melhores da cidade, a chef Ana Melo — do Instituto Gourmet, além de pessoas de outros segmentos, incluindo uma ex-finalista e uma bicampeã deste mesmo concurso.
Enquanto os jurados faziam a apreciação visual e gustativa das tortas para escolher a vencedora, fomos apresentados aos finalistas, e cada um pôde contar um pouco sobre a receita que os levou à condição de finalista.
Enquanto aguardávamos a decisão, após as palavras de Valéria e a homenagem prestada à sua mãe, veio o parabéns oficial com o sopro das velinhas.
A revelação do campeão: Felipe Francisco Cavalcanti com a torta Brisa Suave de Capim-Santo com Limão.
Mais uma história inspiradora, em um dia já repleto de inspiração. Aqui, a culinária, como terapia, se fez valer. Felipe usou a presença na cozinha, com seus erros e acertos, para ajudá-lo em momentos difíceis. Fato que também me trouxe recordações, já que iniciei na cozinha como terapia, onde a produção culinária me ajudava e me inspirava na vida profissional médica.
Retornei para casa alegre, inspirado por toda a nostalgia que o evento me trouxe. Pelas histórias de superação do Felipe e, ainda mais, pela gigantesca e inspiradora de Valéria e do poder de seu empreendedorismo.
Celebrar os 35 anos da Torteria Haguanaboka foi — e também é — celebrar nossas próprias memórias: os almoços rápidos, as sobremesas inesperadas, os bolos de aniversário e os desvios propositais para saborear morangos em festa. Vida longa e próspera ao Grupo Haguanaboka — e que cada fatia continue trazendo sabor às nossas histórias.
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