A produção artística não é universal, ela é desenvolvida num território com características culturais próprias. Nesse sentido, mostrar e apoiar a arte local nos apresenta situações da nossa própria vida, do nosso cotidiano. Uma possibilidade de leitura e reflexão pela lente de um artista.
Temos tantas tradições que nos afetam e ao sermos lembrados disso em algum trabalho artístico nos sentimos parte desse território. Acessamos nossas lembranças e memórias afetivas e assim temos um certo conforto de pertencimento.
Nem sempre é uma lembrança óbvia, direta, mas quando temos uma ação educativa num museu, por exemplo, esse processo fica muito mais potente.
Fachada reformada do Museu Municipal de São Jose dos Campos (Foto: Divulgação/PMSJC)
Elementos fundamentais no processo de comunicação que, juntamente com a preservação e a investigação, formam o pilar de sustentação de todo museu, qualquer que seja sua tipologia. Entendidas como formas de mediação entre o sujeito e o bem cultural, as ações educativas facilitam sua apreensão pelo público, gerando respeito e valorização pelo patrimônio cultural. (CADERNO de Diretrizes Museológicas, 2006).
O Educativo consiste num sistema que antecede a abertura das exposições e se conclui com publicação de materiais e possível itinerância das obras. A preparação do material pedagógico, a abordagem e atividades práticas, que podem ser desenvolvidas no museu após as visitas, são elaboradas pela equipe de educadores do miseu.
Não se realiza uma mediação sem pesquisa e estudo com seus educadores.
É muito importante ir ao encontro dos públicos com esses materiais prontos. E para isso as relações institucionais são uma chave importante. Escolas, universidades, instituições culturais, associações, secretarias de outras cidades etc.
Os grupos de escolas, por exemplo, agendam suas visitas e são recebidos por educadores da entidade. Os professores que acompanham os grupos recebem antes o material pedagógico e podem relacionar contextos e técnicas daquela produção artística às experiências escolares ou do cotidiano dos alunos em seus projetos.
Após um ano de reformas, o Museu Municipal de São José dos Campos foi reaberto dia 29 de janeiro com primeira exposição prevista para março. Teremos a oportunidade de rever as obras do acervo do grande artista Johann Gütlich, incluindo uma obra recém-restaurada. Importante citar a instalação de um elevador garantindo acessibilidade no Museu.
Johann Gütlich, pintor holandês, viveu em São José dos Campos e foi o idealizador da Escola de Belas Artes que funcionou em nossa cidade nos anos 60. Foram inúmeras as suas contribuições e o público que visitar a exposição saberá que o artista chegou ao Brasil em 1952, convidado para expor no Museu de Arte Moderna de SP e RJ. Chegou a São José dos Campos em 1962 a convite da Prefeitura Municipal para formação da Escola de Belas Artes, que atraiu alunos de toda região.
Uma de suas alunas que se formou nesse período foi a D. Angela Savastano, folclorista e vice-presidente do Centro de Estudos da Cultura Popular.
Em 2022, a definição de museu que vigorava desde 2007 foi ampliada: o conceito de museu passou a incluir instituições que trabalham com memória, diversidade e participação social.
“Um museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos e ao serviço da sociedade que pesquisa, coleciona, conserva, interpreta e expõe o patrimônio material e imaterial. Abertos ao público, acessíveis e inclusivos, os museus fomentam a diversidade e a sustentabilidade. Com a participação das comunidades, os museus funcionam e comunicam de forma ética e profissional, proporcionando experiências diversas para educação, fruição, reflexão e partilha de conhecimentos”.
Definição aprovada em 24 de agosto de 2022, durante a Conferência Geral do ICOM em Praga. No Brasil, o processo foi coordenado pelo Comitê Brasileiro do ICOM (ICOM Brasil).
Museus não são somente espaços expositivos na vida contemporânea. Um dos seus principais objetivos deve ser o educacional, incluído na politica cultural da instituição, uma tarefa bastante abrangente.
O Museu do Folclore, por exemplo, tem uma agenda anual vinculada às escolas do município e um Educativo muito preparado para receber públicos diversos.
É importante que diversos públicos tenham acesso ao patrimônio artístico-cultural por eles mantido.
Em 2024 teremos então no Museu Municipal de São José dos Campos uma exposição do acervo e no mínimo três outras de curta duração.
Essas de curta duração talvez sejam exposições itinerantes vindas de outros museus ou instituições. Talvez sejam produzidas pelo próprio Museu Municipal. Vou imaginando possibilidades como algumas retrospectivas de artistas de nossa cidade ou que aqui viveram e produziram.
Um nome? D. Sônia Oliveira, grande pintora que usava a têmpera, técnica de veladuras que exige muita disciplina e conhecimento (criada no século V, na Itália, a tempera consiste em misturas de pigmentos com água e gema de ovo). Ela criou e manteve com bastante entusiasmo uma Escola de Artes por anos na Rua Santa Clara. Seus filhos guardam um grande acervo de suas pinturas.
Outro artista que teve uma trajetória muito significativa em nossa cidade foi Bene Viana. Publicitário, professor e artista plástico que produziu esculturas e pinturas. Além de obras em acervos particulares, sua família conserva vários esboços e obras.
Luiza Irene Galvão também tem obra no acervo do Museu Municipal. Artista e estudiosa da cultura joseense, frequentou o Atelier Livre de Pintura nos anos 60 com D. Sonia Oliveira e Eliane Borges. Luiza Irene mora em S. José dos Campos e Eliane, em Campinas. Ambas continuam produzindo pinturas. Uma exposição com essas três pintoras seria uma grande oportunidade de conhecermos mais sobre suas trajetórias e apreciar suas obras.
É importante que o Museu Municipal divulgue, exponha e realize ações educativas com as artes plásticas da cidade, de ontem e de hoje e viabilize a apreciação presencial de obras de arte.
Teatro, música, dança, literatura se apresentam continuamente com festivais, mostras e oficinas, seja por seleção com curadoria especializada, seja por programas em circuitos nos espaços culturais e teatros. Esse sistema não basta, contém inúmeras falhas e valores que devem ser debatidos e ajustados. Porém, acontecem seguidamente favorecendo formação de público e apresentação da produção local.
Faz algum tempo, as artes plásticas vêm sendo colocada de lado, sem prestígio, restringindo a nova geração de apresentar sua produção.
Por que as artes plásticas do município tornaram-se um elefante branco na sala da instituição? Espaços independentes tentam bravamente se manter.
A Galeria Poente quando produziu o I Salão de Artes e o Expressão Feminina, em 2023, recebeu uma quantidade surpreendente de jovens artistas querendo apresentar seus trabalhos. Esses eventos reverberaram em novas oportunidades para os artistas selecionados.
Renata Freitas, jovem artista que participou do Expressão Feminina, acabou de participar do “Casa de Mulheres”, no Museu de Arte Moderna da Bahia. Outra artista que participou de eventos da Galeria Poente, Thayla Barros, produziu recentemente a pintura nova na fachada do SESC São José dos Campos.
O SESC São José dos Campos tem um espaço que a primeira vista parece restrito, mas a criatividade expográfica é sempre inovadora.
Encerrou-se dia 4 de fevereiro VIVER ATÉ O FIM O QUE ME CABE! – SIDNEY AMARAL: UMA APROXIMAÇÃO. Arte de um jovem artista que faleceu em 2017, aos 44 anos, e que participou com pinturas e esculturas na última Bienal de SP.
Aqui no SESC, pudemos apreciar seus esboços, esculturas e pinturas com um Educativo excelente preparado inclusive com obras táteis.
Após o término das exposições, a Bienal de SP faz itinerância de várias obras por museus de cidades brasileiras. Quem sabe o Museu Municipal não entra nessa agenda da Bienal de SP e outras instituições, como o Centro Cultural Banco do Brasil.
O Museu Municipal poderia incluir em sua agenda exposições de artistas locais através de processos seletivos com júri especializado (como nos festivais de teatro e dança, por exemplo) dentro de uma política cultural clara e abrangente, com continuidade. A produção existe, mas não chega no público.
Além do desenvolvimento de um Educativo e difusão para entidades públicas e privadas, essas exposições podem gerar itinerância, criando assim um circuito contínuo. Práticas de processos artísticos podem ser elaboradas fomentando a apreciação e incentivando experiências orientadas pelos próprios artistas.
E para finalizar, com utopia, os trabalhos também poderiam ser expostos e apreciados no contexto urbano, pontos de ônibus e outdoors, por exemplo. Estimular a documentação por grupos locais de vídeo para serem distribuídos em escolas completaria o impacto multiplicador deste processo.
O Museu seria o pilar dessa rede que fomenta seu público e amplia sua frequência.
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