No livro How Wars Are Won, publicado em 2002, o historiador Bevin Alexander discute como seria a guerra do futuro: não uma batalha de drones e robôs, como imaginado na ficção científica, mas sim conjuntos de operações em menor escala — grupos de forças especiais manobrando para obter controle de pontos estratégicos e rotas logísticas.
Vinte anos depois, podemos comparar a realidade da atual “guerra do futuro” na Ucrânia com as previsões do começo do século. A conclusão: nossa realidade é uma mistura do passado com o futurista.
Por um lado, o feitio da guerra não parece ter mudado fundamentalmente. Ainda temos batalhas de artilharia, a extenuante guerra de trincheiras faz pensar na Primeira Guerra Mundial, e os avanços de infantaria em massa continuam. Tanques e veículos blindados ainda são de vital importância.
Mas, por outro, a disponibilidade de drones, especialmente drones baratos e fáceis de usar, está alterando radicalmente a face do campo de batalha.
Tecnologia letal
No final de 2021, tive a oportunidade de ver como os pesquisadores do macaco muriqui (Brachyteles arachnoides), em São Francisco Xavier, usavam um drone Mavic Executive para identificar e registrar aglomerações de macacos, de longe e sem interferir com as rotinas dos primatas.
Na época, pensei o incrível que era uma tecnologia destas, com visão termal, velocidade de 70 km/h e zoom de até 56 vezes, estar disponível para civis. Como toda tecnologia avançada, o potencial para usos mais sinistros parecia grande.
Alguns meses depois, a invasão russa tinha começado e podíamos ver, quase que em tempo real, como estes mesmos drones se tornavam componentes essenciais da nova guerra: usados para controlar e ajustar o fogo da artilharia, para fazer reconhecimento de áreas controladas pelo inimigo e até para derrubar obuses e granadas sobre veículos ou tropas inimigas — com direito a filmagem do evento até a hora H.
E era só o começo. Conforme a guerra foi avançando, os drones passaram a desempenhar um papel cada vez mais importante.
O famoso Bayraktar
Nos primeiros meses, falava-se muito dos drones turcos Bayraktar TB2, que os ucranianos usaram para visar as colunas de blindados russos próximos de Kyiv. Chegaram até mesmo a compor uma música celebrando os sucessos do Bayraktar, que virou uma espécie de ícone nacional da resistência ucraniana.
Mas o Bayraktar é um drone militar, praticamente um avião autônomo — disponível em menores quantidades, com um custo elevado de 5 ou 6 milhões de dólares. Além disso, é facilmente detectável por sistemas de defesa aérea.
Após a retirada russa do norte ucraniano, a guerra se consolidou em torno das linhas de fortificações de cada lado onde, como nenhum lado domina o espaço aéreo, as operações de drones como o Bayraktar se tornaram mais difíceis e custosas, e o drone perdeu boa parte de sua relevância, embora tenha sido usado para visar depósitos de petróleo em território russo e, provavelmente, tenha tido um papel fundamental no afundamento do cruzador russo Moskva.
Entram em cena os Mavic
Havia chegado a hora dos Mavic. Fabricados pela empresa chinesa DJI, são os drones mais populares para as filmagens aéreas hoje em dia. Com preços que começam a partir de US$ 400, oferecem o melhor custo-benefício da indústria. Se você viu um vídeo de drone no YouTube, ele quase com certeza foi filmado por um Mavic.
Após começarem a empregar os Mavic para reconhecimento, os ucranianos logo perceberam que os modelos maiores podiam ser adaptados para derrubar pequenos projéteis. Os Mavic passaram a ser comprados em grandes quantidades. Campanhas de arrecadação de fundos nas redes sociais pegaram fogo, e logo milhares de drones estavam sendo enviados diretamente para os militares no front.
Apesar de, logo no começo da guerra, a DJI ter banido as vendas de drones tanto para Ucrânia quanto Rússia, os drones eram comprados em outros países da Europa e enviados para cá. Chegou-se a um ponto em que, de acordo com o Primeiro-Ministro ucraniano, a Ucrânia era responsável por 60% das aquisições de drones Mavic no mundo todo. Seu uso havia se tornado uma parte essencial da guerra nas trincheiras, ajudando a reduzir um pouco a vantagem russa em artilharia e munição, que chega a ser de 7 a 1 em certas áreas.
A produção doméstica aumenta
Em setembro do ano passado, como reportado pela BBC, a disponibilidade dos drones da DJI diminuiu bruscamente em toda a Europa Ocidental. A China parece ter tomado medidas para dificultar a aquisição de drones para as forças ucranianas.
Como solução, os ucranianos aumentaram a produção doméstica de drones semelhantes aos Mavic. As peças são importadas ou fabricadas aqui mesmo, e grupos de civis ou membros da Defesa Territorial passam horas e horas fabricando drones pequenos, simples, mas eficazes, que a seguir são enviados diretamente para o fronte.
Drones-suicidas: Shahed, Switchblade, Lancet
A campanha russa contra alvos civis aumentou bastante no final de 2022, quando entraram em cena os drones Shahed, de fabricação originalmente iraniana (embora atualmente já sejam produzidos em território russo, com o nome “Geran”). Esses drones são, essencialmente, pequenos aviões, capazes de voar centenas de quilômetros, pesando cerca de 200 kg e com carga útil de explosivos de até 40 kg.
Também os Shahed são relativamente baratos — cerca de 20 mil dólares cada, muito menos do que o custo de um míssil de defesa aérea. Considerando-se o dano causado à infraestrutura ucraniana no inverno de 2022-2023, eles foram um investimento russo que se pagou, e continuam aterrorizando os céus ucranianos quase todas as noites. Aqui na Ucrânia, eles passaram a ser apelidados de “mopeds”, por fazerem um barulho semelhante ao de um ciclomotor.
Embora os ucranianos não tenham produzido em massa um equivalente dos Shahed, alguns ataques recentes a alvos estratégicos russos, como este depósito de petróleo em São Petersburgo, mostram que eles têm o potencial de nivelar o jogo nos ataques à infraestrutura, retaliando com sucesso e visando alvos bem distantes do campo de batalha. Esta parte da guerra ainda está bem no começo, mas pode se tornar um aspecto crucial da defesa ucraniana ao longo de 2024. E já existem vários novos modelos ucranianos de drones de longo alcance, embora pouco se saiba sobre alguns deles — confira o gráfico abaixo.
Já nas trincheiras do front, drones kamikaze menores passaram a ser empregados por ambos os lados: os ucranianos têm (em pequena quantidade) os Switchblade, de fabricação americana, enquanto que os russos têm (em grandes quantidades) o Lancet. Estes drones são bem diferentes: essencialmente, pequenos foguetes teleguiados, carregando alguns quilos de explosivos a velocidades de até quase 200 km/h. Esses drones FPV (first-person view) são, sim, pequenos, mas muito letais para os veículos inimigos.
Com a proliferação dos drones, a guerra eletrônica também tem aumentado. Contudo, como costuma ser na tecnologia bélica, a ofensiva está sempre um passo à frente da defesa, e é improvável que capacidades eletrônicas consigam neutralizar o potencial ofensivo dos drones no futuro próximo.
Leia mais: Para ficar de olho em 2024: Trump, Oriente Médio, Ucrânia
Drones aquáticos — uma especialidade ucraniana
A Rússia tem a dúbia distinção de ser a única grande potência naval a perder não um, não dois, mas vários navios militares de diferentes classes para um país sem marinha. Os responsáveis pela façanha são drones marítimos fabricados pelos ucranianos.
Os modelos aqui são bastante simples: essencialmente, trata-se de barcaças blindadas repletas de explosivos, equipadas com câmeras e detonadores na proa e controladas por GPS. Foram justamente esses drones que motivaram Elon Musk a cortar o sinal da Starlink sobre a Crimeia no ano passado, a fim de impedir ataques ucranianos à frota russa. Mas a essa altura os ucranianos parecem ter aprendido a se virar sem a Starlink, como mostrou o ataque desta semana que afundou uma fragata russa perto da costa da Crimeia (confira o vídeo aqui).
Outras versões mais avançadas, como o “Sea Baby”, podem até disparar mísseis enquanto avançam sobre os navios inimigos. Também aqui, os drones são uma forma de nivelar um pouco a superioridade russa — uma barcaça que custa algumas centenas de dólares para montar, mas que navega 200 km e consegue causar estragos irreparáveis a um navio russo, é um investimento excelente. Tanto é que a frota russa, ao longo de 2023, foi forçada a se distanciar da costa ucraniana, desfazendo o bloqueio do porto de Odessa, essencial para a economia ucraniana.
No futuro, mais drones
No começo do ano, Zelensky anunciou o objetivo de produção de 1 milhão de drones em 2024. A medida foi criticada por alguns por… não ser suficientemente ambiciosa! 1 milhão de drones em 1 ano seria pouco demais para a continuação da guerra. Isso mostra a importância que é dada à questão dos drones atualmente.
Reforçando ainda mais a tese, o comandante das Forças Armadas Ucranianas, Valery Zaluzhny, enfatizou recentemente a necessidade de se ganhar uma vantagem tecnológica sobre a Rússia — especialmente com o uso de drones e outros veículos não-tripulados.
Com cada vez menos apoio dos aliados ocidentais, a Ucrânia precisa depender da própria capacidade bélica para sobreviver. O futuro ucraniano pertence, em grande medida, ao futuro da guerra de drones.
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